Aqui está um guia de palavras regionais utilizado no quadrinho Voz de Esperança Garcia.
Em Ordem Alfabética e sua referida referência bibliografia:
Aguadas: “Mesmo criando o gado solto, o administrador de uma fazenda para expandir e ganhar mais lucro em suas terras investia em construções de cercamentos (curral), vaquejadouros e aguadas (em épocas de estiagens o gado era levado para locais onde havia água principalmente riachos e olhos d'águas). A terra precisavam ser ocupadas e produzidas, por isso, serem melhores protegidas. Esse papel era feito pelos escravizados.”
(Lima, Solimar Oliveira. Fazenda: pecuária, agricultura e trabalho do Piauí escravista (séc. XVII - séc. XIX)/Solimar Oliveira Lima.- Teresina : (EDUFPI, 2016).)
Atori, Pedaço de Mandeira: “No Brasil, é uma varinha confeccionada a partir do galho de goiabeira ou amoreira, instrumento que simboliza a relação de Òṣógìyan com Oyá Oníra (Òriṣàṣ, Orixás, Divindades do Candomblé) e serve para afastar ikú, eguns (a morte, espíritos e eliminar as energias negativas. É também uma defesa para a guerra (Kileury & Oxaguiã, 2014). ”
(GAIA, R. S. P.; SCORSOLINI-COMIN, F. Candomblé Ketu e o sincretismo religioso no Brasil: perspectivas sobre as representações de Òṣàlá na diáspora. Memorandum: Memória e História em Psicologia, v. 37, 2020.)
Cabeças de Gado: “Sobre a produção de gados, apenas Oeiras, em dois anos, produziu 22.960 bezerros distribuídos em 871 fazendas. A Tesouraria da Fazenda considerava que “em regra no Piauí a fazenda de gado que dá 200 bezerros em um ano, calcula-se que possui 800 cabeças, porque um quarto é quase sempre produtivo. Ainda assim, a prática dos administradores das fazendas públicas, por exemplo, pareciam antigas. Em 1776, o inspetor das fazendas do departamento do Piauí e os criadores foram acusados, em devassa, de vários procedimentos irregulares. A lista incluía mal tratos, castigos, abuso sexual, ameaças, prisões de escravizados e de declararem um número menor de bois que eram enviadas para a Bahia.
(LIMA, Solimar Oliveira. Fazenda: pecuária, agricultura e trabalho no Piauí escravista (séc. XVII - séc. XIX). Teresina: EDUFPI, 2016.).
Cacimba: s.f buraco que se cava até atingir um lençol d' água subterrâneo; poço, cisterna.
A Cacimba já era utilizada na época que Esperança Garcia viveu.
O inglês George Gardner (médico, botânico) já comentava isso em passagem pelo piauí (Oeiras) em 1836:
“... as fazendas de gado vacum estão situadas sobretudo nas fraldas de vários olhos d'água que delas nascem. Para que no sertão uma fazenda mereça o nome de boa, deve ser primeiro bem provida de água, porque sendo o Piauí sujeito a secas, como todos os altos sertões do Brasil, as fazendas com faltas de água são as primeiras que ficam despovoadas de seus gados...”
Os deslocamentos de gado e pessoas no território do Piauí era fundamental graças aos rios e curso de águas perenes. Outro destaque relevante sobre o solo do estado era que suas terras possuíam a “inclinação” para o pastoreio. A reduzida necessidade do uso do trabalho e sua presença de pastos conferiram às terras sua destinação natural.
“... aquele horroroso trabalho de deitar grossas matas abaixo, e romper as terras a força de braço, como sucede nos engenhos do Brasil, nas roças das Minas, e por este mesmo Estado do Pará, e Maranhão na cultura dos seus gêneros. Nele pouco se muda na superfície da terra, tudo se conserva quase no seu primeiro estado. ” João Pereira Caldas (Roteiro do Maranhão a Goyaz pela capitania do Piauhy). ”
(LIMA, Solimar Oliveira. Fazenda: pecuária, agricultura e trabalho no Piauí escravista (séc. XVII - séc. XIX). Teresina: EDUFPI, 2016.
).
Capitães do Mato Estão entre os personagens mais contraditórios da cultura brasileira. Eram odiados duas vezes pelos escravizados, por se tratarem ex-escravos, que experimentaram na pele como era a vida de um escravizado no Brasil, mas principalmente por dedicarem suas vidas a procurar escravos fugidos. Em virtude de conhecerem como seus ex-companheiros de cativeiro fugiam, seus efetivos em recuperar "quilombolas" - como eram chamados os escravos que escapavam para as matas - eram altos. Faziam isso como um modo de sobrevivência.
Coroa além-Mar: Relacionado a Coroa Portuguesa. O Marquês de Pombal (1750-1777) foi o maior e mais importante representante da Coroa Portuguesa na época. João Pereira Caldas era governador do Piauí na época que Esperança Garcia foi para Porções (1759-1769), foi nomeado para essa função pelo governador e capitão-general Francisco Xavier de Mendonça Furtado da Capitania Grão-Pará e Maranhão em 1759. Sua função, mesmo sem experiência, consistia em acabar com os abusos, extorsões e fraudes contra o patrimônio da Coroa na capitania de São José do Piauí. Antes disso, em 1718 foi determinada a separação do Piauí da jurisdição do Maranhão. A vila da Mocha foi criada em 30 de junho de 1712, mas apenas começou como uma unidade administrativa (comarca) após ordem régia de 26 de dezembro de 1717. Ainda assim, sua administração política ficou sob a jurisdição de Pernambuco até 1728, depois à do Maranhão.
Existia uma necessidade de a Coroa Portuguesa acabar com as improbidades na administração do Piauí. Foi João Pereira Caldas que expulsou e confiscou os bens dos Jesuítas. Foi um governador medíocre pela falta de experiência política e por apoiar as políticas do Marquês de Pombal. Tinha também a função de aumentar a quantidade de vilas (nomeando novos administradores), criar uma força armada para a Coroa portuguesa e organizar os diversos problemas que as fazendas e vilas tinham com os povos indígenas.
(VARIA HISTORIA, Belo Horizonte, vol.26, nº 44: p.499-521, jul/dez 2010.)
Casarão: Foi baseado na pesquisa de mestrado de Pedro Henrique Tajra Hidd Pearce Brito "Arquitetura e Urbanismo do Período Colonial na Cidade Pedro I (PI), 2015". Nessa pesquisa ele faz uma pesquisa bem profunda sobre como eram as casas, fazendas e vilas do período colonial piauiense.
Disponível: https://ppgau.ufba.br/sites/ppgau.ufba.br/files/disspedrotajra.pdf
Escravizados na Fazenda Poções: “Poções contava com dez escravos. Entre eles Supriano (Cipriano) - Criolu, vaqueiro, 44 de anos. Vivia também sua esposa, a escrava Ana, 20 anos, e o filho José Carlindo, dois anos. Gracião Angola, 45 anos, e sua mulher Graçia, 38 anos, fecham a lista de escravos casados na fazenda.
Marcelino Crioulo, José Crioulo, Marcos Crioulo, Francisco Crioulo e Nazário Crioulo viveram e conheceram Esperança Garcia e seus filhos. ”
(ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Dossiê Esperança Garcia: símbolo de resistência na luta pelo direito. Organização de Maria Sueli Rodrigues de Sousa et al. Teresina: EDUFPI, 2017. 139 p.).
Faz tudo: “Relacionado a falta de mão de obra especializada entre os negros escravizados e as fazendas. Negros escravizados que faziam de tudo numa fazenda era um problema social grave. Já que uma das principais características da mão de obra masculina nas fazendas era a permanência de uma ocupação quase inteiramente com o gado e animais. O garoto de 12 anos já era considerado um adulto 'vaqueiro', basicamente não teriam mais nomes de nascença, seria chamado assim pelo resto da vida. Raramente passando muito tempo nos rebanhos. Já que eles também precisavam cobrir outros serviços. Era mais comum encontrar 'vaqueiros' na labuta da roça, farinhadas, canaviais, engenhos, alambiques ou transportado o que era produzido nas fazendas para os 'grandes centros' e repartições públicas do império.
Para não comprometer a unidade econômica pastoril (pecuária e subsistência), meninos eram enviados de todos os cantos do estado para Oeiras para aprender outras funções, onde teriam aulas com os 'mestres' carpinteiros, pedreiros e ferreiros. Ainda tinham as funções de oleiro (fazedor de telhas e tijolos) e seleiro de grande importância nas fazendas. Os afrodescendentes foram utilizados na fabricação de canoas, de solas e cordas. As fazendas remetiam todos esses serviços manuais para os Armazéns da Fazenda Pública e tinham que cumprir uma cota anual.
As coisas poderiam piorar, já que o vaqueiro era, no geral, tratado como trabalhador desqualificado. Além disso, existia uma desconfiança pela administração das fazendas, que o acusava de ser preguiçoso, matar bois de forma ilegal para consumir a carne e roubar e vender cavalos. Por isso, para as inspeções do piauí, eles não poderiam ganhar a função de criadores de gado (livres). E isso durou até mais ou menos em 1864. ”
(LIMA, Solimar Oliveira. O vaqueiro escravizado na fazenda pastoril piauiense. Revista História: Debates e Tendências, v. 7, n. 2, jul./dez. 2007, p. 138-154.)
Feitor: Eram pessoas nomeadas pela administração da coroa portuguesa em nome do governador, assim chamados inspetores, administravam o dízimo, a contagem de renda, vendas de gados, cavalos e escravos. Também eram os responsáveis pela produção de queijos, requeijões, manteigas... tudo que era produzido numa fazenda.
(ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Dossiê Esperança Garcia: símbolo de resistência na luta pelo direito. Organização de Maria Sueli Rodrigues de Sousa et al. Teresina: EDUFPI, 2017. 139 p.).
Garça: é uma homenagem a ave mais comum que existe no bairro Poty Velho (Teresina). Ela quase desapareceu das margens do rio poti décadas atrás, porém, se consegue avistá-la por toda a extensão do rio nas proximidades do encontro dos rios (Poti-Parnaíba) logo ao amanhecer e próximo ao pôr do sol.
A origem do bairro Poty é antiga. Neste local viviam os índios Potis, mas com a chegada dos portugueses, quase foram extintos. Os que sobreviveram, foram forçados a escravidão pelos fazendeiros da região. São esses índios que formaram a Barra do Poti. A mais antiga ocupação humana de Teresina.
Em 1760, já havia grupos de moradores, sendo sua maioria descendentes dos Potis. Eram formados por pescadores, canoeiros e plantadores de fumo e mandioca.
Homens Livres: “Trata-se de um grupo sobre o qual há poucas fontes. Muito se sabe sobre os escravizados e seus senhores, mas ainda pouco sobre uma população de homens e mulheres livres espalhados pelas províncias do Império do Brasil. Dados de censos populacionais do Século XIX, o Brasil tinha uma população entre 4,5 e 4,8 milhões, e cerca de um terço seria escrava. Em 1850, teria chegado a, aproximadamente, 7,5, com os escravos, e o que respondia por algo em torno de 30% do total. ”
(CHRISTILLINO, Cristiano Luís. O homem livre e pobre no Brasil oitocentista. In: OLIVEIRA, Tiago Bernardon de (Org.). Trabalho e trabalhadores no Nordeste: análises e perspectivas de pesquisas históricas em Alagoas, Pernambuco e Paraíba. Campina Grande: EDUEPB, 2015. p. 57-84.)
Na sociedade colonial do Piauí, além dos escravizados e dos senhores das fazendas, havia homens livres, cujas atividades eram várias. Iam desde religiosos, artesãos, sapateiros e pequenos comerciantes em vilas; mas nas fazendas estavam basicamente envolvidos com o trabalho com o gado e agricultura.
“Os trabalhadores livres agregados e escravizados, embora proibidos de fixarem moradia e plantios, faziam retiradas de madeira para construir casebres e utilizar em casa, além de plantarem e criarem animais para sobreviverem, graças as distâncias que algumas fazendas tinham da outra. Às vezes, eles morriam sem saber o tamanho real da terra que tanto trabalhavam em vida. ”
(LIMA, Solimar Oliveira. Fazenda: pecuária, agricultura e trabalho no Piauí escravista (séc. XVII - séc. XIX). Teresina: EDUFPI, 2016.).
José Esteves Falcão: Tenente da cavalaria da Coroa Portuguesa. Era administrador da fazenda Algodões. Ele também acumulava a mesma função na fazenda Serrinha, era muito respeitado pelos governadores do Piauí, principalmente João Pereira Caldas (1760), ao ponto de ser cogitado para o cargo de Almoxarife da Fazenda Real. Coisa que se tornou real em 1763 até o ano de 1765. Depois retornou para a função de administrador das fazendas Algodões e Serrinha. Ele continuou trabalhando para a Coroa Portuguesa até 1780.
(ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Dossiê Esperança Garcia: símbolo de resistência na luta pelo direito. Organização de Maria Sueli Rodrigues de Sousa et al. Teresina: EDUFPI, 2017. 139 p.).
Marcha do Gado: “Foi chamada assim porque a unidade econômica pastoril (pecuária e subsistência) foi base alimentar da região nordeste do século XVII até meados do Século XIX. As fazendas produziam carne seca, charque e principalmente carne verde para enviar para os grandes centros econômicos do Nordeste. Sendo Salvador (BA), o principal comprador das boiadas do Piauí. O nordeste se expandiu graças aos criadores de gado que iam instalando fazendas, povoando extensas e novas terras, exterminando índios, extraindo riquezas naturais e ganhando poder. ”
(LIMA, Solimar Oliveira. O vaqueiro escravizado na fazenda pastoril piauiense. Revista História: Debates e Tendências, v. 7, n. 2, jul./dez. 2007, p. 138-154).
Moléstia: Em “Casa-grande & senzala”, publicado em 1933, encontram-se passagens sumárias e muito esparsas sobre alguns tipos de doenças de escravos negros. Na 51ª edição desta obra, pode-se destacar o seguinte: a) “[...] diz-nos Jobim que, em 1835, anotou as seguintes moléstias, como predominantes entre os operários e escravos domésticos do Rio de Janeiro: sífilis, hipertrofia do coração, reumatismo, bronquite, afecções das vias aéreas, pneumonias, pleurises, pericardites [...] tétano, hepatites [...]” (FREYRE, 2006, p. 553). ”
(Doença e Mortalidade de Escravos no Brasil Oitocentista: Breve Exame da Produção Historiográfica recente (2004-2014). Anais do V Encontro Internacional UFES/Paris-Est).
Mo fé òrìsà mi: "Eu Amo Meu Orixá" na língua Yorùbá.
Nação Jaicó: “Durante o período que Esperança Garcia viveu, havia uma população livre de 8.102 pessoas e 4.644 escravos. 2.050 casas e 536 fazendas. Em Oeiras, habitavam 655 pessoas livres, 465 escravos e tinha 270 casas. Contando fazendas, casas e habitações sob sua jurisdição, salta para 1.549 escravos com 2.757 pessoas livres.
Havia também os índios aldeados. Dois dos principais aldeamentos, criado graças aos esforços dos missionários da Companhia de Jesus estavam localizados nas proximidades de Oeiras. Um grupo eram os índios Gueguê e outro era a Nação Jaicó.
As primeiras notícias sobre a origem de Jaicós datam de 1731, com a criação de uma aldeia de índios chamada ICÓS (cujo cacique se chamava Jaicó ou Jacó), provavelmente pertencente ao ramo Tupi. No início da povoação, porém, o local era conhecido por Cajueiro.
A criação desses aldeamentos tinha como função afastar e esconder os índios para escapar da ação predatória dos exploradores portugueses, espanhóis, holandeses e franceses, além de facilitar a catequização dos mesmos pelos padres jesuítas, porém, tempos depois os índios voltavam a se dispersar.
Os jesuítas sofreram severas perseguições do Marquês de Pombal, que obcecado pela cobiça confiscou-lhes os bens e expulsou-os do País. No livro “Tratados da Terra e Gente do Brasil”, de autoria do padre Fernão Cardin, secretário do primeiro visitador jesuíta do Brasil, no mesmo período do governo Mem de Sá, aparece pela primeira vez a denominação das tribos “Jeicó” ou Jaicó” que estariam localizadas nos sertões de São Francisco e confins de Mato Grosso, que seria a tradução em tupi de “Nós Estamos Quietos”.
(ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Dossiê Esperança Garcia: símbolo de resistência na luta pelo direito. Organização de Maria Sueli Rodrigues de Sousa et al. Teresina: EDUFPI, 2017. 139 p.).
Obaluaiê: Obaluaiê (em iorubá: Ọbalúwáiyé), Abalaú, Abaluê, Abaluiaê, Obaluaê ou Yorimá é o orixá da cura em todos os seus aspectos, da terra, do respeito aos mais velhos e protetor da saúde. É chamado sempre que necessário afastamento de enfermidades.
“Entre os povos africanos, trazidos para o Brasil como escravos entre os séculos XVI e XIX, os mais importantes para a formação da cultura nacional foram os bantos e os iorubás (nagôs), oriundos dos rios Congo (atuais Congo e Angola) e Níger (atual Nigéria), além dos jeje, dos reinos do Daomé.
Esses povos possuíam uma estrutura social, econômica e religiosa muito complexa e avançada. Como esses povos, principalmente os bantos, foram trazidos para o Brasil desde o início da colonização e se espalharam por um vasto território, tendo grande contato com portugues e índios, sua religião foi-se pouco a pouco misturando ao xamanismo indígena e às crenças religiosas e mágicas européias.
Essa amálgama de elementos de outros rituais, resultou uma religião totalmente nova e essencialmente brasileira, a umbanda.
Resumindo o quadro atual das religiões de origem africana, verificamos que elas podem ser divididas em cultos de influência predominantemente iorubá é o candomblé nagô, que se chama apenas candomblé na Bahia e no Rio de Janeiro, xangô em Pernambuco, tambor de nagô no Maranhão e batuque no Rio Grande do Sul. O povo jeje (daomeano) originou o candomblé da nação jeje, chamado de tambor de mina no Maranhão; e a religião banto originou o candomblé da nação angola e congo. Os dois últimos tipos de candomblé nagô; somente se mantém inalterado o tambor de mina. ”
Nas regiões Norte e Nordeste, as crenças africanas foram fortemente influenciadas pelas tradições ameríndias e européias, originando várias tradições religiosas e mágicas sincréticas, típicas dessa área do país.
(GASPAR, Eneida Duarte. Guia de religiões populares do Brasil. Rio de Janeiro: Pallas, 2002.).
Pimenteiras, Índios: “Em 1772, José Esteves recebeu uma carta instrutiva do governador Lourenço Botelho de Castro autorizando-o a reorganizar os negócios da capitania. Principalmente resolver o problema com os índios Pimenteiras.
Segundo Ana Stela de Negreiros Oliveira (Povos Indígenas do Sudeste do Piauí: Conflitos e Resistência nos Século XVIII e XIX, 2004), “apesar do Piauí existir diversas tribos no território, a partir de 1759, somente os Pimenteiras estavam em guerra com os colonizadores”.
Os Pimenteiras, segundo o historiador Estevão Pintos, “eram considerados Caraíbas, que eram índios vindos das cabeceiras do Tapajós e do Xingú e representantes desse grupo foram encontrados nas margens dos rios citados no Baurés e no São Miguel, assim como, nos sertões de Pernambuco e do Piauí”.
O ponto alto dos embates entre a Coroa e os Pimenteira aconteceu no início de 1769, quando o grupo, que durante algum tempo esteve em paz com os colonizadores, voltou a atacar fazendas, matando animais e moradores. Durante toda a segunda metade do século XVIII e início do XIX, várias bandeiras foram organizadas para combater os Pimenteiras na região sudeste do Estado. A resistência do grupo levou diversos fazendeiros a abandonarem suas fazendas. Eles também começaram a ser citados (via cartas) pelos administradores, comandantes, religiosos e moradores como ameaça e sendo acusados de cometerem insultos e hostilizar as pessoas.
O extermínio surgiu da crescente ânsia da Coroa de aumentar o número de fazendas, vilas e cidades na região. Coisa que só iria realmente acontecer no século XX com o incremento da produção da maniçoba para a produção de borracha.
Foram punidos pela Coroa Portuguesa de até 1812, grupos organizados com até 100 homens atacavam os indígenas. Em 1815 são dados como extintos pelo governo do Piauí.
Poções, Fazenda: “O Capitão Antônio Vieira do Couto, foi escolhido para administrar a fazenda Poções, para onde Esperança Garcia havia sido transferida.
A Fazenda Poções era próspera – Duas casas, currais, chiqueiros para cavalos, bois e porcos. Haviam riachos e uma terra fértil com bastante plantação de mangas e madeira. ”
(ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Dossiê Esperança Garcia: símbolo de resistência na luta pelo direito. Organização de Maria Sueli Rodrigues de Sousa et al. Teresina: EDUFPI, 2017. 139 p.)
Peador: “Para a fazenda, ser vaqueiro era a vocação natural dos trabalhadores. Os "filhos machos" nasciam e cresciam para conduzir, vigiar e cuidar dos rebanhos. O termo "vaqueiro" se tornou designação até para meninos ainda no colo da mãe. ”
“Meninos, desde cedo, precisavam aprender as tarefas (pastoreio), dentro do contexto da pecuária, eles eram ainda crianças, por isso, eram fiscalizados e moravam na residência do inspetor. O trabalho mais comum para as crianças era o de "peadores", principalmente nos campos próximos a fazendas chamados de "aguadas e pastos".
(LIMA, Solimar Oliveira. Fazenda: pecuária, agricultura e trabalho no Piauí escravista (séc. XVII - séc. XIX). Teresina: EDUFPI, 2016.).
Pajé: A pajelança é um rito mágico afro-ameríndio. O objetivo básico do ritual é encontrar métodos para curar doenças. Os espíritos que se manifestam são os próprios orixás africanos; em outros, podem aparecer caboclos ou almas de animais.
(GASPAR, Eneida Duarte. Guia de religiões populares do Brasil. Rio de Janeiro: Pallas, 2002.).
Senzala: A base para Senzala foi retirada do livro Casa Grande e Senzala de Gilberto Freye (1933). O autor, fazia uma relação entre senhores e escravizados para pensar a formação da sociedade brasileira patriarcal em seu livro.
A palavra Senzala tem origem africana e significa morada, a escolha do nome Galpão como a primeira Senzala que Esperança Garcia vivia foi por causa do significado da palavra. Significa lugar que se guarda utensílios da lavoura e residência dos peões e escravizados de uma fazenda.
A divisão interna que prevê espaços individuais (quartos, banheiros) não existia, nem mesmo a divisão por unidades familiares, tendo em vista que a própria noção de família se alterou com o tempo. Não havia divisão de cômodos e dormiam todos juntos, num mesmo espaço, apenas com separações entre homens e mulheres e crianças.
Para dormir o chão era o destino. Diretamente na terra ou sobre palhas eram as formas que os escravos encontravam para se acomodar para a noite de sono.
(FREYRE, Gilberto. Casa-grande e Senzala. São Paulo: Global, 2004)
Tropeadas: “Pessoas dedicadas ao transporte das boiadas. Levava 40 dias saindo de Oeiras, por exemplo, para Bahia. 50% do rebanho não era comercializado quando chegavam no destino final. O gado sofria de ataques de animais, fugas, morriam de fadiga e ocorriam diversos furtos. Ainda assim, era um negócio rentável. Esses tropeiros, eram formados por trabalhadores escravizados (tangedores, guias e cargueiros), vaqueiro passador (responsável pela boiada e trabalhadores livres (mestiços e índios) ”
(LIMA, Solimar Oliveira. O vaqueiro escravizado na fazenda pastoril piauiense. Revista História: Debates e Tendências, v. 7, n. 2, jul./dez. 2007, p. 138-154.)
Vaquejada: Relacionado a pega do gado solto pelos vaqueiros. ” Os vaqueiros apanhavam um gado com laços e bolas, isso se dava, graças, aos descampados que era uma marca da vegetação em grande parte das terras do Piauí. Esse instrumento era uma longa vara, um pouco mais grossa em uma ponta que na outra; na parte mais grossa se fixava uma peça de ferro, quadrangular e aguçada. Montando a cavalo, com essa vara na mão, o vaqueiro marcava com a vista o animal que desejava pegar, ele precisava feri-lo na anca com a ponta da vara, assim o animal caia facilmente.
A pega também possibilita, entre os vaqueiros, a exibição de habilidades, o que permitia aos que se destacavam o gozo de reconhecimento e respeito. Vaquejadas nasceu no Piauí.
Nas grandes propriedades, as vaquejadas eram realizadas duas vezes ao ano. Janeiro e junho. Sem dúvida as vaquejadas eram ponto principal para o entretenimento dos vaqueiros e donos de fazendas no ano. Tornando-se um espaço de sociabilidade para o conjunto de habitantes das fazendas. O evento acabou também servindo como um grande comércio a céu aberto para venda e corte de gado, cavalo e outros animais entre as fazendas. O vaqueiro passava a ser valorizado e ganhava status aquele se saia melhor nas vaquejadas. “
(LIMA, Solimar Oliveira. Fazenda: pecuária, agricultura e trabalho no Piauí escravista (séc. XVII - séc. XIX). Teresina: EDUFPI, 2016.)
Todas as Referências Bibliográficas utilizada no processo de criação do quadrinho A voz de Esperança Garcia:
ADICHIE, Chimamanda. O perigo de uma história única [Vídeo]. Produção TED, 2014. 18min46s. Disponível em: https://www.ted.com/talks/chimamanda_ngozi_adichie_the_danger_of_a_single_story/transcript?language=pt.
CANEVACCI, M. Sincretismos: uma exploração das hibridações culturais. São Paulo: Studio Nobel, 1996.
CARNEIRO, Aparecida Sueli. A construção do outro como não-ser como fundamento do ser. 2005. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005.
CELESTINO, Mairton. A Vida Escrava no Ambiente das Fazendas de Gado Vacum e Cavalar, séc. XVII. In: LIMA, S. O.; SILVA, R. C. (Orgs.). Norte ao Sul: Escravidão Brasil séc. XVI - séc. XIX. Teresina: EDUFPI, 2018.
CHRISTILLINO, Cristiano Luís. O homem livre e pobre no Brasil oitocentista. In: OLIVEIRA, Tiago Bernardon de (Org.). Trabalho e trabalhadores no Nordeste: análises e perspectivas de pesquisas históricas em Alagoas, Pernambuco e Paraíba. Campina Grande: EDUEPB, 2015. p. 57-84.
DIAS, Claudete Maria Miranda. Povoamento e despovoamento: da pré-história à sociedade escravista colonial. Revista Fundamentos, São Raimundo Nonato, v. 4, p. 417-429, 2006.
EISNER, Will. Quadrinhos e arte sequencial. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
FANON, Frantz. Pele Negra, Máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.
FERRETTI, Sérgio E. Sincretismo Afro-Brasileiro e Resistência Cultura. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 4, n. 8, p. 182-198, jun. 1998.
FREYRE, Gilberto. Casa-grande e Senzala. São Paulo: Global, 2004.
GAIA, R. S. P.; SCORSOLINI-COMIN, F. Candomblé Ketu e o sincretismo religioso no Brasil: perspectivas sobre as representações de Òṣàlá na diáspora. Memorandum: Memória e História em Psicologia, v. 37, 2020.
GASPAR, Eneida Duarte. Guia de religiões populares do Brasil. Rio de Janeiro: Pallas, 2002.
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LIMA, Nilsângela Cardoso (Org.). Páginas da História do Piauí colonial e provincial. Teresina: EDUFPI, 2020. 278 p.
LIMA, Solimar Oliveira. Fazenda: pecuária, agricultura e trabalho no Piauí escravista (séc. XVII - séc. XIX). Teresina: EDUFPI, 2016.
LIMA, Solimar Oliveira. O vaqueiro escravizado na fazenda pastoril piauiense. Revista História: Debates e Tendências, v. 7, n. 2, jul./dez. 2007, p. 138-154.
LIMA, Solimar Oliveira. Esperança. Nossa Consciência tem nome. Informe Econômico, Teresina, v. 22, n. 4, Nov./Dez 2009-Jan/2010. Disponível em: https://periodicos.ufpi.br/index.php/ie/issue/view/ie22.
MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Ser Escravo no Brasil: século XVI-XIX. Tradução de Sonia Furhman. Petrópolis, RJ: Vozes, 2016.
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ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Dossiê Esperança Garcia: símbolo de resistência na luta pelo direito. Organização de Maria Sueli Rodrigues de Sousa et al. Teresina: EDUFPI, 2017. 139 p.
REIS, Fabio Pinto Gonçalves dos. Cultura escrita e a escravidão brasileira: algumas práticas e seus significados no século XIX. In: CONGRESSO DE LEITURA NO BRASIL, 15., 2005, Campinas. Anais [...]. Campinas: ALB, 2005.
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